quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Why jump out of perfectly good airplanes??

Porque raio é que alguém, no seu perfeito juízo, salta dum avião que está a funcionar perfeitamente bem? Será loucura? Será coragem? Ou um pouco de ambos?

Para muitos saltar de um avião a 5kms da terra é considerado um acto de loucura….não posso deixar de me sentir uma verdadeira privilegiada, é que no passado o ‘louco’ era fruto da escolha dos deuses, era através dos loucos, que os deuses comunicavam com os homens.

Para outras pessoas, saltar de um avião é um acto de coragem: a capacidade de enfrentar um medo. A incerteza que o pára-quedas abra….. If it can’t kill you it aint a sport!

É difícil expor num post todo o sentimento à volta do salto. Vou (apenas) tentar…

A primeira vez a gente nunca se esquece… Foi no Algarve, há exactamente 2 anos.

Fui-me deitar tranquila, longe estava eu de imaginar que a partir desse dia um novo capitulo da minha vida ia começar. Achava que ia fazer uma loucura, que ia sentir a adrenalina e que iria ter uma história para contar, e era só isso. Been there, done that. Ponto final… Mas assim que cheguei à zona, e à medida que me preparava para o salto, percebi claramente que tinha encontrado a minha tribo. Nunca me senti tão encaixada e integrada como ali, rodeada de pessoas com as quais me identifiquei logo. É lógico que não sou excepção, estava nervosa, quer dizer, em boa verdade estava em pânico.

Durante os dez minutos que demora a subida ruidosa dentro do avião, todos equipados, sentados e encostados uns nos outros, em fila indiana, pela ordem de saída, eu (presa de movimentos e com as pernas dormentes) subia submersa em pensamentos incoerentes onde imagens, isentas de sentimentos, passavam rapidamente pela minha cabeça, imagens das minhas conquistas e vitorias intervaladas por imagens de cenas estranhas e sem qualquer sentido, onde confundia imagens da minha filha a sorrir para mim com imagens de pessoas estranhas, pessoas que estavam ali, sentadas ao meu lado, com o mesmo objectivo que eu: desafiar a vida.

Assim que o avião descola não há volta a dar. Em frente é que é o caminho. Desistir? Nem pensar… Ajoelhou? Vai ter de rezar! Aos poucos a imagem vertiginosa da terra começa a desaparecer, as árvores começam a parecer pequenos arbustos, os terrenos sinuosos parecem planos, e em menos de 10 minutos a pequena terra de onde descolámos transforma-se no mundo. A porta abre-se, o frio e o medo entram precipitadamente; os primeiros pára-quedistas começam a abandonar o avião, sinto uma espécie de angústia, doem-me os dentes, as pernas dormentes começam a tremer, sinto uma vontade de saltar muito grande, a espera pela minha vez transmite-me um sentido de dever, de missão, I can do it! Estou confiante, é um nervoso tranquilo, que me deixa em alerta: não há nada que me escape, estou atenta a tudo à minha volta, o som, o frio, a qualquer movimento, a qualquer respiração, tudo observo.

Chega a minha vez. Estou calma. Respiro fundo. Estou confiante. Não há hesitações. Há dois instrutores que vão saltar comigo, eles sorriem, fazem caretas um ao outro para aliviar a (minha) tensão. Estão literalmente à altura do salto que se propuseram fazer comigo. Sinto total segurança e firmeza da parte deles, sei que não me vão deixar à deriva, vão estar ali, ao meu lado, a ensinar-me a voar. Assim que saio do meu ‘porto seguro’ e enfrento a brisa de ar fresco que rapidamente se transforma em vento que me massaja o corpo e me sustem o voo o nervosismo desaparece e a adrenalina apodera-se de tal maneira que se torna impensável voltar a trás. Estou a voar.

Heaven, I’m in heaven, and my heart beats so that I can hardly speak, and I seem to find the happiness I seek….

Até que a um determinado momento abro o pára-quedas, assim que a calote apanha ar e se começa a desenvolver, acaba a intensidade da queda livre e começa a paz do voo. Estou sozinha, pendurada numa asa pela primeira vez. Tenho que a levar para o chão. Tenho que a manobrar. Sinto-me bem. Eufórica. Não consigo deixar de sorrir. Tenho o mundo aos meus pés!

À medida que desço à terra a minha auto-estima sobe ao céu! Aterrei! Sou a maior! Quero repetir. Não…….. EU TENHO de repetir.

Hoje, quase 300 saltos depois, se ainda tenho medo? Sim tenho, mas é um medo diferente: já não vou para o desconhecido, já não há o pânico, mas o medo continua. O medo que vem com a experiencia. É um medo que aumenta com a noção que vamos tendo, à medida que vamos aprendendo, que ainda estamos longe de saber tudo. É um medo saudável. Que nos mantém conscientes e concentrados, e sobretudo que não nos deixa desleixar em relação à segurança.

Mas ser pára-quedista não é só saltar de aviões (que funcionam perfeitamente bem)… é muito mais do que isso.
Para mim é uma forma de estar na vida. É uma atitude, uma maneira de ser. Um pára-quedista é (no geral) uma pessoa ‘com pelo na venta’, com personalidade, com carisma. É admirado entre os seus. É uma pessoa que, apesar de não ter medo da morte, adora a vida, e tira proveito dela. É uma pessoa do mundo, com horizontes largos e visões ambiciosas. É solidário e solitário. Está bem com ele próprio e com o mundo que o rodeia, respeita o próximo. Gosta do seu íntimo, aprecia-se. Trata-se bem. Não tem medo de arriscar, de enfrentar desafios. Tem presença.

Um pára-quedista sente-se bem entre os seus pares, sente-se em casa, mesmo que esteja na Rússia. Não tem receio do julgamento alheio, e aceita outras formas de pensar, consegue entreter uma ideia, um pensamento diferente do seu, sem ter que o aceitar.

Mas não é tudo um mar de rosas… quem é mordido pelo bichinho do pára-quedismo dificilmente deixa o desporto. Assim, as pessoas próximas do pára-quedista, sofrem pela sua ausência, não entendem como é que lhes deixamos de dar atenção e começamos a viver obcecados com os saltos. Como deixamos de fazer férias em família para estar na zona. Tudo o resto deixa de ter importância, e as prioridades alteram-se de vez. Ou és pára-quedista ou então esquece. É do género: ‘a minha namorada fez-me um ultimato: ou ela ou o pára-quedismo…. vou sentir saudades dela’

Once a skydiver always a skydiver!
Take air!

10 comentários:

Anónimo disse...

Compreendo que seja uma sensação de liberdade; compreendo que dê muita adrenalina; compreendo que se goste muito de fazer.
Não compreendo que seja uma prioridade; não compreendo que seja uma obcessão; não compreendo que seja indispensável. Porquê? parece-me uma emoção/sensação efémera; parece-me uma alienação do real, à procura de...; parece-me um aprisionamento da livre escolha individual.

Martissima disse...

Compreendo que para ti seja quase impossível entender que seja uma prioridade.

É que o salto em si, gera uma emoção efémera, dura «apenas» 60 segundos... Mas a prioridade não se refere ao salto, isso seria muito redutor.

A prioridade é o paraquedismo, que representa um mundo e não só 60 segundos de adrenalina....

O paraquedista, não procura, antes encontra-se no paraquedismo.

Anónimo disse...

A máxima do "paraquedista não procura, encontra-se no paraquedismo" é válida para todos os sectores da actividade humana...; pode aplicar-se a desportos, afectos, profissões, comunidade, etc.; o interessante é compreender o porquê da dissolução do "eu" verdadeiro na "tribo"! O que é que me leva a dissolver as minhas prioridades individuais, o meu caminho único e que me pertence, numa "tribo"? Fazer parte de, compreendo e todos fazemos parte de alguma coisa, grupo ou comunidade! Mas que ela interfira, em absoluto, tornando-se prioridade da vida de cada um...!!!! Não sei...Considero que é urgente perceber o porquê! Just a comment.....

Martissima disse...

Olá 'Anonimo'

Os teus comentários são bem vindos sempre... :)

A «minha» máxima sobre o paraquedismo aplica-se a tudo, sem duvida! Só a apliquei na vertente paraquedista porque é o tema do meu post....

Todavia não queria que ficasses com a ideia que os paraquedistas encontram-se na tribo e deixam de ser seres individuais com personalidades proprias e passam a agir e pensar de acordo com a tribo... não era esta a interpretação que eu queria passar...

Achas que alguém que 'não tem receio do julgamento alheio, e aceita outras formas de pensar, consegue entreter uma ideia, um pensamento diferente do seu, sem ter que o aceitar' não dissocia o verdadeiro 'eu' da tribo??

Digo tribo sem o sentido de 'seita' que tu lhe estás a dar....

A prioridade na tua vida não é seres feliz? A minha é....

Anónimo disse...

Bom texto Martissima,GOSTEI!!

Anónimo,acredito que voçê e muita gente não compreenda algumas coisas,eu tambem á muitas coisas que não entendo/compreendo!

Tento sempre entender o porquê de tudo,mas as vezes tambem não consigo,e quando assim é...simplesmente aceito.

Anónimo disse...

Oi Marta

Que bem que escreves, mas continuo a questionar-me... Que palavras teremos que escrever para que todos entendam o que sentimos?
Bem, eu ainda não as encontrei!
Parabéns, blog porreiro.

Uma situação bem importante de salientar, é o facto de todos os desportos que já practiquei, nunca nenhum me tinha proporcionado tanto espirito de equipa, companheirismo, preocupação, entreajuda, amizade, etc. etc.
Bla, bla, bla...

PS:Anonimo experimenta a sensação da queda livre, pelo menos uma vez. Acredita que vale a pena, hoje em dia está ao alcance de qualquer um.

Até breve... bem lá em cima.

Marco

Anónimo disse...

Oi Marta!!!!
Não vou alongar-me muito na apreciação ao que escreveste!
Digo-te só, que tentares (e que bem o fizeste) explicar a alguém que nunca experimentou ou teve a ousadia de experimentar libertar-se a ponto de "voar", o que tu sentes em relação ao mundo do pára-quedismo, é uma "luta" na qual nunca sairás vencedora!!!
No entanto, adorei ler o que escreveste e revejo-me nas tuas palavras…
Continua, evolui, sê segura e acima de tudo...diverte-te!!!
"Vê mais longe quem voa mais alto!"
João Ferreira
"Zebraman"

Graça disse...

Martinha,
Diz-me é quando vais estar em Alvor para eu ir experimentar!!!
E como sempre... escreves lindamente!

Anónimo disse...

Olá Marta,
Descreveste muito bem as sensações e emoções vividas num salto de paraquedas. Concordo com tudo o que escreveste e partilho também a paixão e devoção pelo paraquedismo. A cumplicidade que nos une, como paraquedistas, é unica.
Compreendo o que sentes qdo referes que largamos tudo e todos pelo paraquedismo. O paraquedismo muito mais que um desporto torna-se num vicio (saudável, claro) e é sem dúvida uma forma de estar na vida, e só quem a vive compreende. Contudo, acho que viver verdadeiramente a vida não é ficar agarrado a algo, é viver tudo e de tudo um pouco. Parar um pouco, ser racional, e acho que podemos (e devemos) sempre conciliar o paraquedismo com a vida pessoal, outro desporto, ou o que for.
Apesar de, por razões pessoais, não saltar há já quase 3 anos e mesmo não sabendo quando voltarei a saltar (guardo o meu equipamento religiosamente!), sou, e serei para sempre paraquedista!
Sandra

Peter Pan disse...

Olé Maluca!!!

Fiquei simplesmente pasmado!! De boca aberta ao ler a forma tão precisa como pões essas emoções cá para fora. Tá mesmo muito bom!!!
Para aqueles que mesmo sem terem saltado conseguem sonhar lá dentro... Acho que conseguiste uma boa aproximação... è claro que será sempre algo a duas dimensões e captado por um ou dois sentidos apenas...
É como jogar um jogo de paraquedismo numa playstation ou num computador... Por mais que jogues faltará sempre aquilo que tanto nos empurra a voltar e voltar e amar!

Beijinhos cheios de saudades dos nossos tempos em Sevilha!!

Peter.
Para não dizer que